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segunda-feira, 20 de julho de 2015

VAMOS FALAR SOBRE A ARQUITETURA DA SEGURANÇA PÚBLICA NO BRASIL E A RESPONSABILIDADE DAS PREFEITURAS , PROPOSTAS DE REFORMA DO MODELO ARCAICO.

Essa semana entramos em uma discussão acirrada a respeito dos papeis das policias, há uma incultura quase que generalizada no Brasil quanto aos temas: Ordem Pública, Segurança Pública, Policias, Defesa Territorial, Defesa Institucional, Inteligência Policial e Garantia de Ordem Social, esses temas são pouco estudados e analisados sob a ótica da razão.

As reflexões feitas, via de regra estão eivadas de sentimentos corporativos, pensamentos limitados e fora do contexto nacional, à análise perpetrada pelo Doutor Luiz Eduardo Soares nos parece isenta e motivada pela lógica e pela razão, chamo os caros amigos e amigos, irmãos de ideais a fazer a leitura desses textos, depois a pensarem a respeito de como estamos precisados de uma reforma constitucional da SEGURANÇA PÚBLICA, nosso pais absorveu de forma arraigada o FOLCLORE DA SEGURANÇA PÚBLICA, para retirar esse folclore teremos de percorrer alguns anos trabalhando todos os dias e momentos para desmistificar o místico, boa leitura.
TEXTOS PARCIAIS DO PROFESSOR 

DOUTOR LUIZ EDUARDO SOARES

(Professor da UERJ, Ex Secretario Nacional de Segurança Pública, Autor do livro “A elite da tropa” que deu origem ao filme “Tropa de Elite”)




A situação da segurança pública no Brasil permanece grave. Avanços no controle do crime e da violência, em algumas regiões, mesmo significativos, têm sido anulados, no cômputo agregado, pela deterioração verificada em outras, nas quais aumentam, consistentemente, as ocorrências de modalidades criminais relevantes.
O país continua estacionado na faixa dos 25 a 27 homicídios dolosos por 100 mil habitantes. Em termos absolutos, os 50 mil casos por ano correspondem ao segundo lugar, no campeonato mórbido do crime letal intencional em todo o planeta.
As principais deficiências que a arquitetura institucional definida pelo artigo 144 apresenta, arquitetura que inclui as estruturas organizacionais das polícias, isto é, o modelo policial - são as seguintes:

A União tem participação diminuta e papel apenas coadjuvante no campo da segurança pública, salvo em situações extremas ou crises graves. O Departamento de Polícia Federal, de Polícia Rodoviária Federal, o Departamento Penitenciário Nacional e a Secretaria Nacional de Segurança Pública integram o Ministério da Justiça, porém nem por isso articulam-se, organicamente. A fragmentação supera a coordenação, enfraquecendo ainda mais o arsenal já pequeno de unidades e atribuições.

À SENASP compete formular uma política nacional de segurança, mas não se lhe confere autoridade para implementá-la. Seu único recurso de poder é o Fundo que gere e que lhe faculta distribuir recursos como ferramenta de indução. Verbas poderiam, eventualmente, representar um fator indutivo poderoso. Não tem sido o caso, entretanto, em razão do volume de recursos destinados ao Fundo pelo orçamento federal.

A Força Nacional, cujo contingente é pequeno, opera com policiais cedidos, provisoriamente, pelos estados e age somente em circunstâncias bastante específicas e com poderes bastante limitados.

Os municípios são praticamente negligenciados, no artigo 144, não lhes cabendo qualquer responsabilidade e autoridade em matéria de segurança. As guardas civis municipais são reduzidas a zeladoras dos próprios municipais. Esta subestimação mostra-se ainda mais surpreendente e injustificável, quando se a contrasta com a importância dos municípios estabelecida na Constituição e, progressivamente, na legislação infraconstitucional subsequente em matérias decisivas como educação, saúde, assistência social e outras. A desvalorização constitucional colide com a realidade, na medida em que os municípios têm assumido crescente protagonismo também na segurança, mas o fazem ao desabrigo da lei, (Esse texto é anterior ao EGGM, Lei 13.022 de 8 de agosto de 2014, observem o texto a seguir na mesma linha),sobretudo quando criam guardas à imagem e semelhança das polícias militares.

As polícias estaduais, civis e militares, concentram a maior parte de responsabilidades e autoridade. Cada uma delas apresenta deficiências intrínsecas às suas respectivas estruturas organizacionais. Por isso, apesar da grande quantidade de excelentes profissionais, éticos e competentes, os resultados obtidos estão muito aquém das necessidades e da potencialidade agregada de seus profissionais potencialidades obstadas pela irracionalidade sistêmica e pelas desfuncionalidades intrínsecas às corporações. O mesmo se aplica às agências periciais, cuja contribuição seria decisiva para o aprimoramento das investigações se lhes fossem concedidas as condições institucionais e os meios operacionais indispensáveis.

Segundo a Constituição, as polícias militares são forças auxiliares e reserva do Exército (art. 144, parágrafo 6º) e sua identidade tem expressão institucional por intermédio do Decreto nº 88.777, de 30 de setembro de 1983, do Decreto-Lei nº 667, de 02 de julho de 1969, modificado pelo Decreto-Lei nº 1.406, de 24 de junho de 1975, e do Decreto-Lei nº 2.010, de 12 de janeiro de 1983[2]. Em resumo, isso significa o seguinte: o Exército é responsável pelo “controle e a coordenação” das polícias militares, enquanto as secretarias de Segurança dos estados têm autoridade sobre sua “orientação e planejamento”.

Em outras palavras, os comandantes gerais das PMs devem reportar-se a dois senhores. Indicá-los é prerrogativa do Exército (art. 1 do Decreto-Lei 2.010, de 12 de janeiro de 1983, que modifica o art. 6 do Decreto-Lei 667/69), ao qual se subordinam, pela mediação da Inspetoria-Geral das Polícias Militares (que passou a integrar o Estado-Maior do Exército em 1969), as segundas seções (as PM2), dedicadas ao serviço de inteligência, assim como as decisões sobre estruturas organizacionais, efetivos, ensino e instrução, entre outras. As PMs obrigam-se a obedecer regulamentos disciplinares inspirados no regimento vigente no Exército (art.18 do Decreto-Lei 667/69) e a seguir o regulamento de administração do Exército (art. 47 do Decreto 88.777/83), desde que este não colida com normas estaduais.

Há, portanto, duas cadeias de comando, duas estruturas organizacionais, convivendo no interior de cada polícia militar, em cada estado da Federação. Uma delas vertebra a hierarquia ligando as praças aos oficiais, ao comandante-geral da PM, ao secretário de Segurança e ao governador; a outra vincula o comandante-geral da PM ao comandante do Exército, ao ministro da Defesa e ao presidente da República. Apesar da autoridade estadual sobre “orientação e planejamento”, a principal cadeia de comando é a que subordina as PMs ao Exército. Não é difícil compreender o primeiro efeito da duplicidade assimétrica: as PMs estaduais constituem, potencialmente, poderes paralelos que subvertem o princípio federativo.

Nada disso foi percebido, porque o Exército tem tido imensa sensibilidade política e tem sido parcimonioso no emprego de suas prerrogativas. Quando deixar de sê-lo e, por exemplo, vetar a nomeação de algum comandante-geral, as consequências serão muito sérias. Não obstante as cautelas do Exército, os efeitos da subordinação estrutural ao Exército têm sido sentidos no cotidiano de nossas metrópoles. Na medida em que as PMs não estão organizadas como polícias, mas como pequenos exércitos desviados de função, os resultados são, salvo honrosas exceções, os desastres que conhecemos: ineficiência no combate ao crime, incapacidade de exercer controle interno (o que implica envolvimentos criminosos em larga escala), insensibilidade no relacionamento com os cidadãos.

Polícias nada têm a ver com exércitos: são instituições destinadas a garantir direitos e liberdades dos cidadãos, que estejam sendo violados ou na iminência de sê-lo, por meios pacíficos ou pelo uso comedido da força, associado à mediação de conflitos, nos marcos da legalidade e em estrita observância dos direitos humanos. Por isso, qualquer projeto conseqüente de reforma das polícias militares, para transformar métodos de gestão e racionalizar o sistema operacional, tornando-o menos reativo e mais preventivo (fazendo-o apoiar-se no tripé diagnóstico-planejamento-avaliação), precisa começar advogando o rompimento do cordão umbilical com o Exército.

Uma barafunda institucional como essa, gerando ambigüidades, inviabilizando mudanças estruturais urgentes e alimentando confusões, tinha de dar no que deu tantas vezes: greves selvagens, nas quais todos saem perdendo: a população, os governos e os próprios policiais, mesmo quando ganham algumas vantagens residuais. A barafunda tinha de produzir esse resultado catastrófico, sobretudo quando turbinada por salários insuficientes, condições de trabalho desumanas, ausência de qualificação, falta de apoio psicológico permanente e códigos disciplinares medievais, cuja própria constitucionalidade deveria ser questionada, uma vez que afrontam direitos elementares.
Esses códigos são tão absurdos, que penalizam o cabelo grande, o coturno sujo e o atraso com a prisão do soldado, mas acabam sendo transigentes com a extorsão, a tortura, o seqüestro e o assassinato. A falta disciplinar, cometida dentro do quartel, é alvo de punição draconiana. O crime perpetrado contra civis é empurrado para as gavetas kafkianas da corregedoria, de onde freqüentemente é regurgitado para o labirinto burocrático, em cuja penumbra repousa até que o esquecimento e o jeitinho corporativista o sepultem nos arquivos. Os policiais, de norte a sul do Brasil, estão aprendendo a usar o discurso dos direitos humanos a seu favor: cobram salários dignos, condições razoáveis de trabalho e um código disciplinar que os respeite, como profissionais, cidadãos e seres humanos.

Em síntese: as PMs são definidas como força reserva do Exército e submetidas a um modelo organizacional concebido à sua imagem e semelhança. Por isso, têm até 13 níveis hierárquicos e uma estrutura fortemente verticalizada e rígida. A boa forma de uma organização é aquela que melhor serve ao cumprimento de suas funções. As características organizacionais do Exército atendem à sua missão constitucional, porque tornam possível o “pronto emprego”, qualidade essencial às ações bélicas destinadas à defesa nacional. Nesse contexto, entende-se o veto à sindicalização.

A missão das polícias no Estado democrático de direito é inteiramente diferente daquela que cabe ao Exército. O dever das polícias é prover segurança aos cidadãos, garantindo o cumprimento da Lei, ou seja, protegendo seus direitos e liberdades contra eventuais transgressões que os violem. No repertório cotidiano das atividades das PMs, confrontos armados que exigem pronto-emprego representam menos de 1%. Não faz sentido estruturar toda uma organização para atender a 1% de suas ações. Para estas, bastam unidades especiais, configuradas para tais finalidades. O funcionamento usual das instituições policiais com presença uniformizada e ostensiva nas ruas, cujos propósitos são sobretudo preventivos, requer, dada a variedade, a complexidade e o dinamismo dos problemas a superar, os seguintes atributos: descentralização; valorização do trabalho na ponta; flexibilidade no processo decisório nos limites da legalidade, do respeito aos direitos humanos e dos princípios internacionalmente concertados que regem o uso comedido da força; plasticidade adaptativa às especificidades locais; capacidade de interlocução, liderança, mediação e diagnóstico; liberdade para adoção de iniciativas que mobilizem outros segmentos da corporação e intervenções governamentais inter-setoriais. Idealmente, o(a) policial na esquina é um(a) micro-gestor(a) da segurança em escala territorial limitada com amplo acesso à comunicação intra e extra-institucional, de corte horizontal e transversal[4].

Engana-se quem acredita que mais rigor hierárquico, mais centralização, menos autonomia na ponta e regimentos mais duros garantem mais controle interno, menos corrupção, desmandos e brutalidade. Se fosse assim, nossas polícias militares seriam campeãs de virtude. Pelo contrário, sacrificamos a eficiência no altar da disciplina para colher tempestades e saldos negativos em todos os fronts.

Não há nenhuma razão para que as PMs copiem o modelo organizacional do Exército, o que não as impediria, necessariamente, de adotar elementos da estética, da ética e da ritualística militar. Nesse novo contexto, a sindicalização tornar-se-ia legal e legítima. Quem teme sindicatos e supõe possível manter a ordem reprimindo demandas dos trabalhadores, proibindo sua organização, não compreende a história social e as lições que as lutas trabalhistas nos ensinaram. Não entende que o veto à organização provoca efeitos perversos para todos e planta uma bomba de efeito retardado sob nossos pés.

Nesse sentido, faz parte de qualquer iniciativa séria de reforma das polícias e de qualquer política de segurança que mereça este nome (a qual não tem como ser plenamente implementada sem reformas nas estruturas organizacionais, as quais dependem de mudanças no artigo 144 da Constituição), a construção dos meios indispensáveis à gestão, não porque isso baste, não porque superestimemos essa dimensão, mas porque sem esses meios não haverá política alguma.  Permanecerão, as instituições policiais e afins, condenadas ao círculo vicioso do improviso e da reatividade.

PARA LEITURA DO ARTIGO DE FORMA COMPLETA VÁ AO LINK ABAIXO:


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